Técnica aponta com precisão se paciente corre risco de ter câncer

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 16 de setembro de 2018 às 00:54
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:01
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Pesquisadores dos EUA conseguiram classificar quase quatro mil variantes do gene BRCA1

Testes para identificação de mutações
genéticas no BRCA1 estão cada vez mais comuns e acessíveis. Com o resultado em
mãos, médicos podem descartar o risco de malignidade em pacientes com histórico
familiar que sugerem a possibilidade de câncer de mama ou ovário.

Contudo, dos milhares de variantes
conhecidos desse gene, muitos ainda se encontram em um limbo diagnóstico. Não
se sabe se têm ou não potencial para silenciar a função natural de reparação do
DNA e, assim, evitar ou facilitar a disseminação de células tumorais.

Com a tecnologia de edição do genoma
Crispr, pesquisadores da Universidade de Washington em Seattle, nos Estados
Unidos, conseguiram classificar, de forma rápida e com precisão, quase 4 mil
variantes do BRCA1 em apenas seis meses.

A expectativa da equipe é de, nos
próximos dois anos, identificar, em todas as mutações conhecidas desse gene, o
potencial maligno ou benigno e, assim, orientar pessoas que, hoje, não sabem se
tomam iniciativas profiláticas, como a remoção das mamas, ou esperam o câncer
se manifestar. “Devido ao histórico familiar de
câncer de mama ou ovário, é comum mulheres fazerem o teste para mutações no
BRCA1, mas ter uma variante e não saber o que ela significa é muito
estressante”, observa Jay Shendure, pesquisador do Departamento de Ciências
Genômicas da Universidade de Washington e autor sênior de um artigo sobre a
técnica, publicado na revista Nature.

De acordo com ele, atualmente milhares
de mutações encontram-se na categoria das variantes de significado
desconhecido, quando é impossível dizer se podem ou não causar câncer.

Banco internacional

O oncologista Sergio Simon, presidente da Sociedade
Brasileira de Oncologia Clínica (Sboc), explica que, hoje, a principal
ferramenta para a classificação de mutações do BRCA1 é um banco de dados
internacional, o Brotman Baty, no qual, há duas décadas, médicos e laboratórios
de genética inserem informações sobre aquelas encontradas em pacientes. Uma
delas foi descoberta por Simon em uma família paquistanesa que vive no Brasil.

Em dois anos, foram 15 casos registrados de
pacientes com a mutação maligna. Quando não se sabe se a variante pode
desencadear o câncer, é preciso esperar a doença se manifestar para, então,
informar à comunidade científica sobre a classificação da versão do gene. “Com
os relatos de casos, vai ficando mais claro se a mutação é patogênica. Mas esse
é um processo muito demorado”, diz.

Com a tecnologia desenvolvida por um estudante de
PhD do laboratório de Jay Shendure, não será preciso esperar os geneticistas
inserirem mutações no banco de dados, nem a doença surgir para se saber se elas
podem provocar o câncer. Dessa forma, pacientes com alterações hoje
identificadas como desconhecidas já não ficarão sem orientações sobre o
procedimento mais indicado. “Agora, podemos fazer interpretações com confiança.
E isso apenas em um gene, mas, talvez, possamos pegar o mesmo paradigma e
estendê-lo a outros genes”, afirma Shendure.

Alta precisão 

A técnica do pesquisador Greg Finley foi batizada
de edição genômica de saturação e consiste no uso da enzima Crispr, que, como
uma tesoura, corta pedaços do DNA para modificar as sequências. Usando essa
ferramenta, os pesquisadores fizeram diversas alterações no BRCA1, inclusive
algumas ainda não identificadas em humanos, e mediram os efeitos de cada uma
delas em células humanas cultivadas em laboratório. Os cientistas ficaram
surpresos com o grau de acurácia do método, que identificou corretamente
mutações sabidamente malignas e benignas.

Uma das vantagens destacadas por
Finley é poder fazer a avaliação de um grande número de variantes em um curto
espaço de tempo. “Para testar quase 4 mil mutações, levamos cerca de seis
meses. Acreditamos que, em dois anos, conseguiremos classificar todas as
mutações do gene BRCA1”, diz Finley. “Nossa esperança é de que o banco de dados
Brotman Baty continue a crescer e se torne um ponto central para guiar a
interpretação das variantes.” O presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia
Clínica destaca que esse prazo é um avanço muito grande em relação ao que se
tem hoje. “Essa técnica vai clarificar cada vez mais os testes genéticos,
esclarecendo resultados que, agora, ainda são um ponto de interrogação”, avalia
Sergio Simon.


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