Se você quer ganhar mais, deve trabalhar menos, indicam as pesquisas

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 29 de abril de 2017 às 14:06
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:10
compartilhar no whatsapp compartilhar no telegram compartilhar no facebook compartilhar no linkedin

Estudo da Universidade de Stanford diz que a produtividade diminui após 50 horas trabalhadas por semana

Quando Stuart Nomimizu foi transferido de Birmingham, na Inglaterra, para Tóquio, seus amigos e familiares começaram a se preocupar,

Eles raramente ouviam notícias de Nomimizu e tinham a impressão de que ele entrava no escritório de manhã cedo e voltava apenas tarde da noite. Seu horário de trabalho parecia tão extremo que eles nem sempre acreditavam que ele estava trabalhando tanto quanto ele dizia estar.

Para convencê-los, Nomimizu registrou uma semana de sua vida como um “assalariado” no ramo financeiro de Tóquio e postou o registro nas redes sociais para que eles entendessem melhor seu novo estilo de vida. 

O vídeo resultante viralizou no YouTube com mais de um milhão de visualizações. Ele mostra uma semana em 2015 durante a temporada mais movimentada do setor financeiro – de janeiro a março – quando Nomimizu registrou 78 horas de trabalho e 35 de sono entre segunda e sábado (antes de trabalhar mais seis horas no domingo, o que não aparece no vídeo).

Chegou ao ponto em que Nomimizu acumulou tantas semanas de 80 horas de trabalho que ele desmaiou em seu apartamento à noite e quase caiu em cima de um apoio para TV. Quando o período de movimentação máxima finalmente terminou, ele disse que o escritório inteiro ficou “terrivelmente doente”.

Enquanto a carga excessiva de trabalho de Nomimizu era de certa maneira temporária, ele disse que “há pessoas trabalhando para empresas em Tóquio com essa carga horária e vivem dia após dia assim durante o ano inteiro”. 

De fato, maratonas de trabalho fazem parte da cultura local e há até uma palavra em japonês, karoshi, que significa literalmente “morte por excesso de trabalho”.

O Ministério de Saúde, Trabalho e Bem-Estar Social do Japão lançou o primeiro relatório sobre karoshi em outubro do ano passado e apontou que cerca de uma em cada quatro empresas (ou 23%) têm funcionários fazendo mais do que 80 horas extras por mês.

“Os japoneses respeitam muito seus colegas, mas também existe uma dificuldade em falar o que você está pensando”, diz Nomimizu. “Então você tem um monte de pessoas no nível mais baixo que ficarão no escritório até que o chefe vá para casa em um horário ridiculamente tarde”. 

O funcionário de 26 anos explica que, se você é o primeiro a sair, você não será visto como alguém que trabalha bem em equipe.

Mas será que as longas horas de trabalho do Japão são mais produtivas do que as de outras partes do mundo? Nomimizu acha que não. Aliás, há cada vez mais evidências de que trabalhar por longas horas não é apenas prejudicial à saúde mas também nocivo para nossas carreiras e ruim para a produtividade em geral de uma companhia.

Quando menos é mais

Se há outro país conhecido por suas longas horas de trabalho e falta de tempo livre são os Estados Unidos. Uma pesquisa recente do instituto Gallup apontou que a média de trabalho de um funcionário americano empregado é de 47 horas por semana, quase um dia de trabalho a mais do que a carga tradicional das 9h às 17h. 

Além disso, quase um em cada cinco funcionários (18%) trabalham 60 horas ou mais por semana. Apesar de sacrificar seu tempo com família e amigos para ficar no escritório, um outro estudo da campanha americana Project: Time Off descobriu que os “mártires” das longas horas de trabalho têm menos chance de receber um aumento do que seus colegas.

“Nós descobrimos que as pessoas que tiram mais dias de folga – 11 dias ou mais – são as mais prováveis a receber um aumento do que as que tiram 10 ou menos dias”, diz Katie Denis, uma pesquisadora do projeto. “Se você não está avançando – e nós descobrimos que não há relação entre horas de trabalho e avanço na carreira – então por que você está fazendo isso?”

Pouco retorno

Laura Vanderkam, especialista em gerenciamento de tempo e autora do livro 168 Horas afirma que “seu cérebro, assim como tudo, não consegue trabalhar sem limitações”. 

Na verdade, faz mal ir além dos nossos limites. “Quando trabalhamos depois de um certo ponto os retornos diminuem e acabamos cometendo erros”, diz ela. “Nós também não temos as nossas melhores ideias nem energia para resolver problemas”.

Há várias maneiras de tratar o trabalho em excesso. Por exemplo, muitos pensam que é preciso estar no trabalho quando o (a) chefe chega ou vai embora. No entanto, Vanderkam acredita que essa ideia muitas vezes pode ser enganadora. “Talvez a sua chefe queira o espaço só para ela de manhã e na verdade está irritada que você também chegue cedo”.

Vanderkam acredita que muitas pessoas não estão dispostas a criar limites em suas rotinas diárias por medo de não serem vistas como trabalhadoras. “Então nós sabotamos nossa própria produtividade dizendo ‘vou trabalhar o dia todo, almoçar e cair no buraco da internet das 14h30′”, explica.

Lado positivo

Trocar descanso por horas extras não pagas é um mau negócio tanto para funcionários quanto empregadores. 

Um estudo da Universidade de Stanford indicou que a produtividade dos funcionários diminui consideravelmente após mais de 50 horas trabalhadas por semana e cai ainda mais depois de 56 horas semanais chegando a um ponto em que alguém que trabalha 70 horas por semana fica incapaz de produzir algo durante as 14 horas adicionais. 

Estudos parecidos ligaram longas horas de trabalho com afastamentos, perda de memória a longo prazo e diminuição da capacidades de tomar decisões.

E o que as empresas estão fazendo para combater o inevitável esgotamento? Grandes companhias japonesas já tomaram uma decisão a respeito. 

A Toyota estipulou um limite de 360 horas extras por ano (ou uma média de 30 horas por mês), enquanto a agência de publicidade Dentsu acabou de lançar um plano com oito pontos (incluindo encorajamento para férias regulares e desligamento das luzes do escritório às 22h) para melhorar seu ambiente de trabalho após o caso de suicídio de um funcionário motivado por exaustão.

Enquanto isso, na Alemanha, grandes companhias como BMW e Volkswagen limitaram o uso de e-mails depois de certo horário para evitar a hiperconectividade. 

Nos Estados Unidos, bancos de investimento como Credit Suisse e JPMorgan Chase lançaram novas diretrizes de trabalho para dissuadir analistas e associados (especialmente os ‘millennials’) de ir ao escritório nos finais de semana.

Vanderkam diz que quando você opera uma máquina sem manutenção você corre um risco alto de perdê-la com o passar do tempo e possivelmente em um momento bastante inoportuno. Parece que muitas empresas começaram a perceber que acontece o mesmo com humanos.


+ Trabalho