Preconceito é entrave para a contratação de pessoas com deficiência

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 22 de setembro de 2018 às 11:17
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:02
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Caso as empresas seguissem a lei, mais de 820 mil vagas estariam disponíveis para deficientes físicos

Após ser aprovado no
concurso público para professor da rede estadual do Rio de Janeiro, João Carlos
Carreira Alves foi barrado no exame médico. “O médico alegou a surdez em si,
que isso seria um impeditivo para eu exercer o magistério”, conta. Ele recorreu
e acabou conseguindo assumir a vaga.

Ensinou geografia a estudantes surdos por quatro anos. “Um cego
passou pelo mesmo problema. Mas ele recorreu ao judiciário e consegui ser
contratado. Eu não tinha consciência nem que tinha o direito de ter direito”. Isso ocorreu em 1978.

De lá para cá,
segundo Alves, muita coisa mudou, mas ainda há barreiras a serem superadas para
ampliar a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Essa é
uma das bandeiras lembrada no último dia 21 de setembro, Dia Nacional de Luta
das Pessoas com Deficiência. “No geral, a situação melhorou. Mas há muita gente esperta.
Porém, são espertezas dentro da lei. Por exemplo, muitos surdos são contratados
por somente quatro horas, que é o mínimo exigido por lei para contratação com
carteira assinada”, explica.

Hoje, aos 63 anos, Alves trabalha como analista de tecnologia da
informação. O que viveu aos 24 anos o marcou tanto que ele criou Comissão de
Luta pelos Direitos do Deficiente Auditivo. “No quesito acessibilidade, a
situação melhorou, mas falta atender os surdos que não falam e usam a língua de
sinais”, diz.

De acordo com o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), no Brasil são mais de 45 milhões de pessoas com algum tipo
de deficiência. Sendo assim, essa data representa quase um quarto da população
brasileira, cerca de 24%. Em 1991, a Lei de Cotas, Lei 8.213, passou reservar
cargos em empresas para pessoas com deficiência.  

Mercado de trabalho

Dados do Ministério do Trabalho e Previdência Social de 2016
indicam que, caso as empresas seguissem a lei, pelo menos 827 mil postos de
trabalho estariam disponíveis para essas pessoas, que são mais de 7 milhões de
cidadãos que se enquadram nas exigências da legislação.

Entretanto, apenas
381.322 vagas foram criadas. “Muitas empresas preferem pagar multa do que ter
pessoas com deficiência. Falta de vontade, elas estão presas ao que é cômodo.
Para que vou contratar um cadeirante, se vou ter que me adaptar e não sei se
ele vai responder com produtividade”, diz o analista de sistemas Leonardo Knittel,
37 anos.

Com duas formações,
em análise de sistemas e em relações internacionais, Knittel tem baixa visão.
“Sempre as primeiras vagas que surgem são de qualificação muito baixa. É
difícil. Quanto mais se tem qualificação, mais difícil achar emprego. “Eu me
orgulho muito quando ouço que eu preencher uma cota é favor que estou fazendo,
porque entrego produtividade e ainda ajudo a empresa a cumprir uma obrigação
legal”.

Direitos descumpridos

Para a criadora e superintendente do Instituto Brasileiro dos Direitos
da Pessoa com Deficiência (IBDD), Teresa Costa d’Amaral, o Brasil tem muita
legislação para pessoa com deficiência, mas ela não é cumprida na íntegra.
“Emprego e igualdade de condições ainda são questões muito difíceis, empresas
ainda não acreditam na competência da pessoa com deficiência. Temos legislação
de cotas, mas essa legislação não é fiscalizada”, diz.

Segundo Teresa, o grande entrave é o preconceito. “A pessoa com
deficiência é vista com olhar negativo. Falta o olhar para aquilo que o empregado
oferece de importante e no que pode contribuir para a empresa”.

Uma pesquisa feita pelo IBDD e pelo DataSenado mostra que 77%
das pessoas com deficiência acreditam que os direitos não são respeitados no
país. A pesquisa, feita em 2010, é considerada a mais completa por ter
entrevistado diretamente as pessoas com deficiência. Segundo Teresa, ela ainda
reflete o cenário atual.  

Dia de luta

A data de 21 de setembro foi a escolhida para reforçar a
importância da discussão de propostas e políticas públicas para integrar essas
pessoas na sociedade de forma igualitária. A data foi escolhida porque está
próxima do início da primavera, estação conhecida pelo aparecimento das
flores e coincide com o Dia da Árvore, datas que representam o renascer das
plantas, que simbolizam o sentimento de renovação das reivindicações em prol da
cidadania, inclusão e participação plena na sociedade.


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