Por que casos de caxumba continuam crescendo apesar da vacina?

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 27 de julho de 2018 às 01:05
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:53
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Eficácia de vacinas tríplice viral e tetra viral contra caxumba diminui com o passar dos anos

A chegada do inverno e a queda
na cobertura vacinal em todo o Brasil acendem um alerta: além do risco da volta
de doenças já erradicadas no país, como sarampo e poliomielite – pacientes com
caxumba também voltam a elevar a procura por atendimento em emergências de
hospitais e postos de saúde.

O Ministério da Saúde não tem dados consolidados sobre a
doença no Brasil, já que ela não é de notificação compulsória, ou seja, as
unidades de saúde não são obrigadas a registrar quantos casos atendem.

No entanto, informações coletadas de veículos de
comunicação e secretarias da saúde revelam que ao menos seis Estados – São Paulo,
Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Sergipe e Amazonas – registram surtos
cada vez maiores da doença desde 2016.

No Estado de São Paulo, foram observados dez surtos de
caxumba em 2018, com 55 casos. Em 2017, foram 141 surtos com 739 casos, segundo
dados da Secretaria de Saúde do Estado. No Rio de Janeiro, só a capital
registrou 19 surtos em 2017.

surto ocorre quando há dois ou
mais casos de uma doença em um mesmo local, como escola, creche, empresa, entre
outros. Em todos os Estados, a ocorrência da infecção foi registrada
principalmente em adolescentes e jovens.

O inverno é uma das estações mais propícias a surtos da
caxumba, que causa inchaço das glândulas salivares e atinge principalmente
crianças e adolescentes. A outra é a primavera.

As vacinas contra a doença são a tríplice viral (que
imuniza contra sarampo, caxumba e rubéola) e a tetra viral (sarampo, caxumba,
rubéola e varicela), que estão no Calendário Nacional de Vacinação. Mas mesmo
quem já tomou pode estar desprotegido contra a doença, de acordo com
especialistas.

De acordo com especialistas, essa desproteção ocorre
porque a vacina normalmente tem uma eficácia menor contra esta doença em
comparação às outras doenças contra a qual é utilizada – e que tende a diminuir
com o tempo.

As duas doses da vacina
tríplice viral protegem muito bem para o sarampo e muito bem para a rubéola,
mas têm uma eficácia mais baixa para caxumba – cerca de 60% com uma dose só e
80% com duas doses. E essa eficácia se perde com os anos”, a pediatra
Isabela Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). “Isso
não quer dizer que todos os vacinados terão caxumba, mas acontece.”

Sintomas

A caxumba, ou parotidite
infecciosa, costuma causar febre, dor e aumento de volume de uma ou mais
glândulas salivares e, às vezes, das glândulas sublinguais ou submandibulares –
o que causa inchaço na região do pescoço e da mandíbula.

No entanto, de acordo com o Ministério da Saúde, cerca
de um terço dos casos pode não apresentar sintomas.

Mesmo assim, a doença é contagiosa, e é transmitida por
gotículas de saliva expelidas no ar ou pelo contato direto com a saliva de
pessoas infectadas.

Caxumba mata?

O Ministério da Saúde afirmou
que a caxumba “é uma doença com uma taxa de complicações muito baixa e
quase nunca fatal”. Em 2017, 56 casos da infecção levaram à morte.

Os casos de complicações maiores ocorrem quando a doença
provoca pancreatite (inflamação no pâncreas) ou encefalite (no sistema
nervoso).

O tratamento é voltado para aliviar os sintomas.

A caxumba pode “descer”?

Sim. Em 20% a 30% dos casos,
segundo o Ministério da Saúde, a caxumba pode afetar também as glândulas dos
testículos, cerca de quatro a sete dias após o inchaço das glândulas no pescoço
ou mandíbula. Esse tipo de inflamação se chama orquite.

No caso das mulheres acima de 15 anos de idade, pode
acontecer também a mastite (inflamação no tecido da mama), em cerca de 15% das
ocorrências.

E em
5% das vezes, a doença causa ooforite, inflamação nos ovários. Os sintomas
incluem febre e dor na parte inferior da barriga.

A caxumba já foi erradicada alguma vez
no Brasil?

Não. É uma doença sazonal, o
que significa que ela ocorre periodicamente. “A incidência dela diminuiu
bastante após a vacina no Brasil – antigamente toda criança tinha. Mas é
difícil erradicá-la, especialmente porque a única vacina disponível tem uma
eficácia menor para ela”, diz Ballalai.

O país não tem dados
consolidados sobre a doença, mas alguns Estados costumam registrar a quantidade
de surtos que ocorrem a cada ano. Nos últimos anos, segundo Isabela Ballalai,
os surtos têm ocorrido principalmente em adolescentes e jovens. “O que
observamos nesses surtos é que muitos dos jovens não foram vacinados
adequadamente com a segunda dose, e isso é um problema. Só uma minoria tinha a
vacina correta”, diz Ballalai

Casos aumentando

A prevenção da caxumba é feita
pela vacina tríplice viral, administrada aos 12 meses de idade e, pela vacina
tetra viral, aplicada aos 15 meses de idade.

No entanto, segundo dados divulgados esta semana pela
Unicef, a agência da ONU para a infância, a quantidade de crianças que recebeu
a segunda dose de proteção caiu de 77% em 2016 para 41% em 2017. “Acho que
a queda nessa cobertura vacinal tem a parte do governo e da população. O
Programa Nacional de Imunização, que é modelo para o mundo inteiro, é
espetacular, mas não basta ter vacinas, postos de saúde e equipes bem
estruturados. É preciso fazer uma busca ativa das famílias”, disse a
pediatra Cristina Duarte, diretora da Clínica Neovacinas. “Se estava tendo
uma diminuição da aplicação da segunda dose, as famílias tinham que ser
buscadas. Isso provavelmente não foi feito.”

Para Duarte, a influência de
movimentos antivacina nas redes sociais também pode ter contribuído para que
menos crianças de 15 meses tenham sido vacinadas com a tetra viral no último
ano.

Uma das avaliações da pasta
sobre a queda nas coberturas vacinais no país é o próprio sucesso das ações de
imunização – que teve como resultado a eliminação da poliomielite, do sarampo,
da rubéola e síndrome da rubéola congênita – e que pode ter causado em parte da
população a falsa sensação de que não há mais necessidade de se vacinar”,
disse o Ministério da Saúde. “Outra ponderação é que no Brasil há um
desconhecimento individual sobre a importância e benefícios das vacinas. Por
isso, é necessário ressaltar a importância da imunização e desmistificar a
ideia de que a vacinação traz malefícios. As vacinas são seguras e passam por
um rígido processo de validação.”

Quem deve se vacinar

Ministério da Saúde recomenda
que crianças de 12 meses a menores de 5 anos recebam uma dose de tríplice viral
aos 12 meses e uma de tetra viral aos 15 meses.

Crianças de 5 a 9 anos que não foram corretamente
vacinadas antes devem tomar duas doses de tríplice viral, com intervalo mínimo
de 30 dias entre elas.

Da mesma forma, pessoas dos 10 aos 29 anos que não foram
vacinadas ou não têm certeza de que foram devem tomar duas doses da tríplice.

Pessoas de 30 aos 49 anos podem tomar apenas uma dose
desta vacina. A partir desta idade, deve ser avaliada a necessidade da
imunização caso a caso.

No caso específico da caxumba, mesmo que você já tenha
sido corretamente vacinado quando criança, os médicos podem recomendar uma
terceira dose da vacina tríplice viral se a sua escola, universidade ou
ambiente de trabalho tiver um surto de caxumba.

“Mas realmente só em situações de surto. Não é
recomendado fazer à toa”, afirma Isabella Ballalai.

Dúvida se tomou ou não a vacina

Se você é adulto e tomou apenas uma dose da
vacina ou recebeu a imunização antes de 12 meses de idade deve se imunizar
novamente, segundo Isabella Ballalai, da SBIm.

“Na dúvida, é melhor vacinar. Além de prevenir a
caxumba, não podemos deixar o sarampo e a rubéola, que são doenças mais graves,
voltarem”, diz.

A vacina tríplice viral só passou a ser oficialmente
recomendada em todo o país a partir dos 12 meses de idade em 2004. A segunda
dose, com a proteção adicional contra a varicela (tetra viral) inicialmente,
era administrada entre 4 e 6 anos de idade. Em 2014, passou a ser recomendada
aos 15 meses.

Antes disso, havia campanhas específicas de vacinação e
os Estados adotaram a vacina em seu calendário em diferentes momentos. Por
isso, algumas pessoas podem ter tomado apenas uma dose quando crianças, e
estarem menos protegidas.

Quem já teve caxumba deve se vacinar?

Quem já teve caxumba fica
imunizado permanentemente contra a doença, esclarece Ballalai. “Uma
confusão pode acontecer porque há outros vírus que causam um quadro semelhante,
então algumas pessoas acham que tiveram caxumba duas vezes. Mas isso não
acontece.”

Mesmo assim, ela ressalta a
importância de levar em conta as outras doenças contempladas pela vacina – o
sarampo e a rubéola. “Independentemente de você ter tido caxumba, se você não
teve as três doenças e ainda não foi vacinado corretamente, deve, sim, tomar a
vacina”, diz.

Onde tomar a vacina

A vacina
tríplice viral está disponível em toda a rede pública de saúde gratuitamente.
Alguns planos de saúde também cobrem a vacina na rede privada.


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