Menos de 4% dos médicos denunciados aos conselhos perdem seus registros

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  • Publicado em 23 de agosto de 2017 às 16:27
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:19
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Advogada comenta fatores que dificultam a punição dos profissionais considerados culpados

O
Conselho Federal de Medicina (CFM) foi criado em 1951, inicialmente com
competência para fazer o registro profissional do médico e aplicar sanções
referentes ao Código de Ética Médica, entre outras atribuições. Já os conselhos
regionais estão espalhados por todo o Brasil e respondem ao CFM, que busca
normatizar, regular, orientar o exercício da medicina e assim promover o
bem-estar da sociedade. Neste âmbito, com o objetivo de zelar pela conduta e
desempenho ético, os conselhos recebem denúncias diversas e são obrigados a
apurar tais fatos e punir o profissional que não agiu em conformidade com o
Código de Ética Médica.

Segundo
dados obtidos através da Lei de Acesso à Informação e divulgados recentemente,
de 2010 ao início deste ano, a censura confidencial foi o caso mais comum
registrado de sanção a especialistas da área médica, somando 34,1% do total. Na
sequência, vieram as ocorrências de censura pública, com 29%; a advertência
confidencial, com 25%; a suspensão por 30 dias, com 8,2%; e a cassação, com
apenas 3,7% dos casos de punição registrados ao todo. Esses números revelam a
discrepância entre a aplicação de penas brandas e severas, inclusive, a médicos
já condenados.

Sanções – Existem cinco tipos de penas
administrativas para médicos que cometem erros por negligência, imprudência ou imperícia durante o
exercício das suas funções. A gradação dessas sanções vai desde a censura e
advertência confidencial, nas quais a punição ocorre de forma sigilosa, por
meio de notificação documental apenas ao acusado e à vítima da infração
(paciente), até a censura pública, que consiste na divulgação da negligência,
sem detalhes, em Diário Oficial (Estados ou União), a suspensão por 30 dias,
que, como o nome já diz, é um afastamento temporário da profissão; e,
finalmente, a cassação, que é o impedimento definitivo de exercer a medicina,
obtido apenas com o aval do conselho federal de classe.

“Na
prática, vemos que os processos disciplinares de erros médicos são morosos, têm
penas brandas e acabam por reforçar no público a impressão de impunidade”,
afirma Claudia Nakano, advogada especializada em Direito à Saúde no
Nakano Advogados Associados.

Segundo
ela, uma das principais causas da impunidade nas ocorrências de erros médicos é
a morosidade da conduta seguida no Código de Processo Ético Profissional do CFM
e a benevolência das condições de defesa do infrator. “Primeiro os Conselhos
Regionais abrem uma sindicância que demora até 2 anos para ser finalizada.
Durante esse período serão coletados materiais, provas, manifestações por
escrito e feita a audiência. Após o período da sindicância, a denúncia
transforma-se em um Processo Ético Profissional (PEP), se apurada a infração. O
processo poderá durar anos e a vítima aguardar um desfecho que parece não
chegar. E só então ocorre o comparecimento das testemunhas das partes
envolvidas, e depois o julgamento no conselho. O acusado ainda tem a
possibilidade de recorrer. O processo pode durar anos…”, descreve.

Em
resumo, o tempo para julgar um processo ético disciplinar, a operacionalidade
dos conselhos cumulada com a Lei 3.268/57, que é antiga e dispõe sobre os
Conselhos de Medicina, prejudicam a denúncia.

Outra
razão que impede, muitas vezes, a condenação de médicos punidos por
negligências, é a condição natural de risco atrelada à medicina, que dificulta
a caracterização da infração apenas pelas atitudes do denunciado e, com isso, a
obtenção de provas documentais de culpa ou de inocência. Há uma linha muito
tênue entre a probabilidade inevitável de um erro acontecer e a incúria médica.
Por isso, a avaliação pericial na investigação do caso é feita por um outro
médico, com avaliação de todos os pormenores.

Por
isso, em caso de erro médico, recomenda-se ao paciente prejudicado ou aos seus
familiares procurar o Conselho Regional de sua cidade de residência e consultar
um advogado de sua confiança ou a Defensoria Pública de sua cidade, para entrar
com uma ação de responsabilidade civil, com o objetivo de obter o ressarcimento
pelo dano sofrido. “Caso a infração cometida seja com dolo e culpa, é provável
que o médico responda criminalmente”, ressalta Claudia Nakano.

O
representante legal, familiar, amigo ou a própria pessoa que passou pela
situação do erro médico deve denunciar ao Conselho Regional de sua cidade e
acionar a Justiça pleiteando uma reparação pelos danos causados: materiais,
morais e/ou estéticos A única forma de diminuir a impunidade é com a atuação
mais efetiva da sociedade, com o rigor esperado dos Conselhos e da Justiça. 


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