Maioria de mortes maternas no país é entre mulheres negras jovens

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 29 de maio de 2018 às 22:43
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:46
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Problema apresentado com maior frequência é hipertensão, facilmente detectado durante o pré-natal

Uma triste estatística: mais da metade (54,1%) das
mortes maternas no Brasil ocorrem entre as mulheres negras de 15 a 29 anos. A
população negra feminina também tem duas vezes mais chance de morrer por causas
relacionadas à gravidez, ao parto e ao pós-parto do que as mulheres
brancas. 

A informação foi destacada pela doutora em saúde
pública, Fernanda Lopes, durante as discussões da 4ª Conferência Nacional da
Promoção da Igualdade Racial (Conapir). O evento está sendo realizado em
Brasília com a presença de especialistas, pesquisadores e ativistas da causa
racial de vários estados para levantar propostas de enfrentamento ao racismo.

Com base em estatísticas do Ministério da Saúde e da
Organização Mundial da Saúde (OMS), a especialista, que também integra o grupo
de racismo e saúde da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco),
apresentou algumas variáveis que mostram a desigualdade racial no âmbito da
saúde pública. “Estas mulheres morrem com uma frequência maior,
prioritariamente por hipertensão, um problema que poderia ser identificado lá
no pré-natal. Mas, estas mulheres são as que menos têm informações sobre sinais
de parto, que com mais frequência têm o pré-natal considerado inadequado e são
aquelas que mais peregrinam até conseguirem vaga na maternidade para dar à
luz”, destacou Fernanda.

Apesar de o Brasil
ter reduzido consideravelmente os números de mortalidade materna nos últimos
anos, ainda não conseguiu atingir a meta estabelecida pela Organização das
Nações Unidas de reduzir em 75% o índice de mortes até 2015. A cada 100 mil
nascidos vivos, ainda morrem no país uma média de 60 mulheres em idade fértil.

Racismo institucional

A pesquisadora disse ainda que as mulheres negras recebem com
menos frequência recursos para alívio para a dor durante o parto, como tomar
água, andar, tomar banho, ganhar massagem ou mesmo ter a opção de ser anestesiada.
Além disso, de acordo com o levantamento apresentado por Fernanda, as mulheres
negras têm menos chance de ter um acompanhante durante o parto e na maternidade
e estão mais sujeitas a ouvir expressões discriminatórias. Ela cita entre os
dados coletados na pesquisa frases ouvidas pelas pacientes por agentes de
saúde como “na hora de fazer não reclamou”. “Isso é racismo
institucional, é violência obstétrica e é violência de gênero. É um tipo de
violência que só as mulheres vivem”, ressaltou Fernanda. 

A pesquisadora
explicou que o racismo institucional na saúde se expressa pela desigualdade no
atendimento dos profissionais da saúde à mulher negra e na negação a ela de
acesso a proteção e direitos. Este tipo de discriminação também tem impacto na
organização e no funcionamento dos serviços de saúde.“A violência obstétrica
começa no pré-natal. Então, quando a gente está falando lá na atenção básica
que estas mulheres têm menos acesso à informação, isso é expressão de violência
institucional. Se estas mulheres peregrinaram mais até conseguirem vaga no
hospital, é expressão do racismo institucionalizado”, detalhou.

No atendimento
pós-parto, os índices também apontam para uma desvantagem das mulheres negras,
principalmente as mais jovens, em relação às brancas. “Em uma avaliação da
estratégia da família e da Rede Cegonha se observou que eram as mulheres mais
jovens e negras que recebiam com menos frequência a visita da equipe de saúde
da família durante o período de puerpério”, completou.

Entre as propostas para enfrentar o problema, a pesquisadora
sugere que o país melhore as pesquisas sobre percepções das pacientes sobre
atitudes discriminatórias nos serviços de saúde.


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