Infecções causadas por superfungos serão cada vez mais comuns

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 2 de dezembro de 2018 às 19:58
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:12
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Segundo o pesquisador, o fungo só é capaz de afetar pessoas com o sistema imunológico comprometido

As infecções
hospitalares causadas por fungos multirresistentes devem se tornar cada vez
mais comuns, segundo o pesquisador do Instituto de Medicina Tropical da
Universidade de São Paulo João Nóbrega de Almeida Jr. “Se existe a
superbactéria, existe o superfungo também”, disse o especialista que atua
também no Hospital da Clínica de São Paulo ao comparar os fungos resistentes
à superbactéria KPC (Klebsiella
pneumoniae carbapenemase
).

Recentemente, Almeida publicou um artigo no jornal científico Transplant Infectious Disease
sobre o primeiro caso de um paciente contaminado pelo fungo Lomentospora prolificans
na América do Sul. O rapaz havia feito transplante de medula há cerca de um mês
quando foi infectado pelo fungo e acabou morrendo em decorrência da contaminação.

Segundo o pesquisador, o fungo só é capaz de afetar pessoas com
o sistema imunológico comprometido. No entanto, caso a contaminação aconteça, a
letalidade é de mais de 80%. Como ainda existem poucos laboratórios preparados
para identificar esse tipo de infecção, Almeida acredita que possa haver casos
não registrados. “Esse fungo não deve ter em grande quantidade no
ambiente, como em outros países, mas também porque os nossos laboratórios não
são habilitados para fazer o diagnóstico”, afirma.

Existem, entretanto, outros fungos que apresentam uma ameaça
maior por poderem infectar não só pacientes com o sistema imunológico
fragilizado, mas em situação delicada de internação, como em unidades de
tratamento intensivo. Esse é o caso do Cândida auris.

Surtos na América do Sul

Em março de 2017, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) divulgou um comunicado de risco para o fungo, responsável por surtos
em diversas partes do mundo. Foram registradas ocorrências no Japão, na Coreia
do Sul, na Índia, no Paquistão, na África do Sul, no Quênia, no Kuwait, em
Israel, na Venezuela, Colômbia, no Reino Unido, nos Estados Unidos e no Canadá.
O Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos tem emitido
alertas para o fungo.

As ocorrências em países da América do Sul indicam, de acordo
com o pesquisador, que em algum momento o Brasil terá de lidar com o Cândida auris. “A
gente está se preparando com uma força-tarefa nacional com vários pesquisadores
para quando chegar esse fungo no país a gente fazer o diagnóstico correto”,
ressalta.

Agrotóxicos e mudanças climáticas

As infecções hospitalares por fungos têm se tornado mais comuns
devido ao aumento da resistências de algumas variedades desses organismos.
Segundo Almeida, há indícios que o surgimento dos fungos multirresistentes está
ligado ao uso de defensivos agrícolas. “A gente acredita que o surgimento dos
fungos multirresistentes acontece principalmente pelo uso de antifúngicos fora
do ambiente hospitalar. Na agricultura, por exemplo, nas plantações, os fungos
são os principais biodecompositores, vão destruir verduras, plantas”, destaca.

As mudanças climáticas também parecem ter, de acordo com o
pesquisador, uma contribuição para o aparecimento de espécies que não são
afetadas pela medicação existente. “O aquecimento global. As alterações
climáticas vão favorecer o aparecimento de fungos que crescem em temperaturas
maiores. E os fungo que crescem em temperaturas maiores são os potencialmente
patogênicos, porque o nosso corpo tem temperatura de 36 graus”, acrescentou.

Apesar da expansão do problema, Almeida enfatiza que não há
risco para a população em geral. São os sistemas de saúde que precisam se
preparar para lidar com as novas possibilidades de infecção dentro dos
hospitais.


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