Essa doença mata 90% de pacientes não tratados e já migra para região urbana

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 22 de janeiro de 2020 às 23:47
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 20:17
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Migração foi um dos fatores que levaram à nova distribuição geográfica de doença potencialmente fatal

​Doença grave causada por um parasita transmitido por insetos, a leishmaniose visceral se espalhou no Brasil para regiões onde antes não havia incidência da doença.

Antes, ela estava concentrada em estados do nordeste e agora tem avançado para o centro-oeste, sul e sudeste do País. 

Entre as principais hipóteses para explicar a mudança no padrão de transmissão da doença, potencialmente fatal, estão a migração de pessoas do campo para as cidades, o desmatamento e a construção de grandes obras com impacto ambiental. 

Tudo isso pode ter alterado o meio onde vivem os insetos flebotomíneos vetores da doença, como o mosquito palha, conta o professor José Ângelo Lauletta Lindoso, do Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).

Dentre as causas dessa reconfiguração geográfica, Lindoso chama a atenção para o fator migratório. 

Nos deslocamentos de um lugar para o outro, as famílias levam consigo seus animais de estimação.

“O cão infectado, mesmo sem a manifestação da doença, é o principal reservatório do parasita no meio urbano”, explica. Há estudos indicando que, onde há cachorros contaminados, existe maior número de humanos que são infectados por leishmania.

Em artigo publicado na Plos Neglected Tropical Diseases “How visceral leishmaniasis spread through central-suthern Brazil“, Vanete Thomaz Soccol, da Universidade Federal do Paraná, descreve as possíveis rotas de dispersão da epidemia. 

De 1920 a 1980, a doença estava restrita às áreas rurais, e mais recentemente, passou a ser notificada nas zonas urbanas. 

Em 2012, por exemplo, o parasita já tinha sido relatado na região oeste do Paraná (Foz do Iguaçu), longe das regiões epidêmicas.

Ainda segundo o artigo, existem cerca de 1,69 bilhão de pessoas vivendo em áreas de risco de transmissão em todo o mundo, sendo que 90% destes casos ocorreram em seis países, incluindo o Brasil.

“Compreender a dispersão da leishmaniose é importante para o desenvolvimento de medidas de controle, que incluem políticas conjuntas com países vizinhos do Brasil”, destaca o texto.

A leishmaniose visceral é causada pela Leishmania infantum e, se não tratada a tempo, pode levar à morte em até 90% dos casos. 

Afeta os órgãos onde há maior concentração de células de defesa como linfócitos e macrófagos: a medula óssea, o fígado, o baço e os linfonodos. 

As manifestações da doença variam de sintomas como febre, perda de peso e anemia até ocorrências mais graves, como aumento de fígado e baço.

Segundo o pesquisador, existem várias espécies de leishmania no mundo. Em seres humanos, por exemplo, a doença é causada por mais de 20 espécies diferentes, sendo que oito delas ocorrem no Brasil. 

Cada espécie pode exigir diagnóstico e tratamento diferenciados, o que tem sido um dos maiores desafios dos pesquisadores que estudam o protozoário.

No Instituto de Medicina Tropical de São Paulo (IMT) da USP, o médico coordena pesquisas na área de biologia molecular envolvendo doenças infecciosas e parasitárias. 

Um dos projetos em andamento estuda infecções simultâneas por leishmania e HIV, vírus que enfraquece o sistema imunológico e pode levar à aids.

Neste trabalho, se pretende avaliar a ocorrência destas coinfecções em regiões endêmicas e fazer análise do perfil genético da Leishmania infantum.

Segundo o pesquisador, o estudo considera a interseção das áreas de transmissão do parasita e do vírus, uma vez que, ao contrário da leishmaniose, que migrou dos centros rurais para os urbanos, a infecção por HIV teve início nos centros urbanos para depois avançar para as regiões menores e do interior do Brasil.

A pesquisa foi feita com pacientes internados no Instituto Emílio Ribas, provenientes de áreas de transmissão e  também com pacientes de outros estados. 

Nas regiões onde a leishmaniose e a aids se entrecruzam, foram observados aumento progressivo de coinfecções e agravamento do quadro dos pacientes, resultando em mais desfechos com morte ou retorno da doença.

(Fonte: Jornal da USP)


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