Criação de cavalos cresce em SP e mercado projeta cenário positivo

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 11 de dezembro de 2018 às 18:54
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:14
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Região de Ribeirão Preto é considerada estratégica para os negócios por conta da tradição na atividade

Beatriz Biagi Becker cria
cavalos desde 1975, na Fazenda Vassoural, em Pontal, SP, a 40 quilômetros de
Ribeirão Preto. O foco é o mangalarga, mas ela tem, também, alguns da raça
crioulo, que conheceu na década de 1980 durante uma visita ao Rio Grande do
Sul.

Com uma tropa de pouco mais de 100 animais, Beatriz
direciona seus principais esforços na atividade ao melhoramento genético. Entre
os animais com estrutura corporal e temperamento mais aptos à reprodução,
seleciona exemplares para a própria fazenda e vende o excedente. “A minha luta
nesses mais de 40 anos de criação tem sido, principalmente, para popularizar os
cavalos.”

Se depender dos últimos três anos, ela pode comemorar os
investimentos. Mesmo ainda não sendo possível dizer que a criação é popular, já
que seus custos são considerados altos para boa parte da população brasileira,
o mercado de cavalos cresceu neste período, apesar do cenário de crise
econômica no país.

Os números mostram, também, que o estado de São Paulo e
a região de Ribeirão Preto, onde está a Vassoural, acompanharam o ritmo. Com a
expectativa dos criadores de melhora na economia, as projeções são de aumentos
ainda maiores.

De acordo com a Associação Brasileira dos Criadores de
Cavalo da Raça Mangalarga (ABCCRM), só em 2018, houve a adesão de 184 novos
membros. Com esses, são 2.209 associados ativos em todo o Brasil. No núcleo da
Alta Mogiana, que inclui Ribeirão Preto, o crescimento foi de 50% de 2015 para
cá – de 30 para 45 associados.

Já a Associação Brasileira dos
Criadores de Cavalos Crioulos (ABCCC) registrou, também nos últimos três anos,
incremento de 40% no número de animais no território paulista. E a região de
Ribeirão Preto é estratégica para a expansão da raça.

No último concurso “Freio de Ouro”, promovido em agosto,
um cavalo de Santa Rita do Passa Quatro, SP, que pertence a um criador
residente em Ribeirão Preto, se sagrou vice-campeão. É a primeira vez que um
mesmo cavalo vence por duas vezes o concurso, considerado o maior da raça no
país, o que aumenta a visibilidade da região.

Cerca de 85% dos animais da raça crioulo estão divididos
entre os estados da região Sul. Mas foi São Paulo, com o quarto maior plantel
brasileiro, que se tornou o principal alvo da associação a partir de 2015. “No
Sul, o crioulo já está bastante consolidado, ao passo que, em São Paulo e,
especificamente, na região de Ribeirão Preto, existe um forte potencial de
crescimento”, afirma Gérson de Medeiros, analista de expansão da raça e de
novos projetos da associação. 

Motivos

Para um dos vice-presidentes da ABCCRM, Alexandre Oliveira
Ribeiro, alguns fatores ajudam a explicar a alta no mercado de cavalos. Um
deles é a descoberta de novas opções de lazer em família, como as cavalgadas,
que passaram a ser frequentes. Provas e eventos de divulgação promovidos pelas
associações também podem ser citados. Outro, um pouco mais antigo, se relaciona
à disseminação da música sertaneja. “Em todos esses casos, o cavalo propicia um
retorno às origens, à natureza, e isso vem despertando a atenção de muita
gente.”

O médico veterinário José
Roberto Pires de Campos Filho, assessor técnico da Fazenda Vassoural e de
outras propriedades espalhadas pela região, encontra mais uma razão.
“Antigamente, apenas fazendeiros procuravam cavalos para comprar. Hoje em dia,
esse mercado se sustenta com profissionais liberais, que também querem ter
esses animais, e com empresários de diversas áreas que enxergaram esse
potencial e estão montando seus haras.”

Campos
Filho acompanha todo o processo de reprodução na Vassoural, desde a seleção dos
animais para os cruzamentos até o nascimento e o desenvolvimento das crias. Ele
explica que a estação de monta vai de setembro a março no país, mas que, na
fazenda, a opção é por fazer só nos três primeiros meses, para que os potros
nasçam próximos uns dos outros, o que facilita o manejo.

A propriedade tem estrutura
tanto para a monta natural como para inseminações artificiais – em que as éguas
matrizes recebem o sêmen dos garanhões e, após oito dias, os embriões são retirados
e transferidos para fêmeas receptoras, visando preservar as doadoras – que, por
serem de “alto nível zootécnico”, são capazes de garantir o melhoramento
genético.

A cada
estação de monta, a fazenda promove cerca de 15 novos nascimentos. “Esse número
é mantido já há algum tempo, para que a qualidade do manejo também seja
mantida”, afirma Campos Filho. 

Pesquisa

Os números sobre o mercado de cavalos no Brasil não são tão
precisos. Isso porque, de acordo com o professor Roberto Arruda de Souza Lima,
da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/Piracicaba), essa
cadeia produtiva foi vista, durante muito tempo, como menor e pouco
representativa frente a outras da pecuária.

A partir
de 2006, no entanto, essa realidade começou a mudar. Naquele ano, a
Confederação Nacional da Agricultura (CNA) pediu um estudo para constatar se
esse mercado era mesmo supérfluo. E o que se viu foi justamente o contrário.
Lima e outro professor, André Cintra, do Centro Universitário de Jaguaríuna
(UniFAJ), perceberam que os negócios relacionados ao cavalo eram subestimados.

No ano passado, a pesquisa foi
atualizada, para atender a uma demanda do Ministério da Agricultura. O
resultado foi que a cadeia movimenta R$ 16 bilhões ao ano no Brasil, gerando
600 mil empregos diretos e R$ 3,2 milhões indiretos. “No entanto, esses números
ainda podem estar subestimados, porque não consideramos as vendas de cintos,
botas, chapéus. Não era possível separar, de forma minuciosa, quais desses
artigos tinham a ver com cavalo, boi ou música sertaneja.”

O número
de cavalos no país, segundo o Censo Agropecuário de 2017, divulgado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de pouco mais de 4,2
milhões, sendo 214 mil no estado de São Paulo. As raças mais criadas são o quarto
de milha e o mangalarga marchador. Crioulo e mangalarga vêm na sequência.

Para
Sergio Serio, presidente do Núcleo Mangalarga da Alta Mogiana, há
justificativas para isso. Ele explica que as associações das duas primeiras
realizam muitos eventos no país inteiro, o que serve de inspiração para as
outras. Tanto que o próprio núcleo tem investido nisso. Em 2017, criou o
Mangalarga Day, evento de divulgação da raça. Devido à repercussão, foi
ampliado para dois dias na edição de 2018 e também adotado por outros núcleos.

Para eles, os eventos
contribuem para que o mercado de cavalos ganhe novos adeptos, o que ajuda
criadores tradicionais – como o próprio Serio – no sustento da atividade.
Nascido em Palermo, na Itália, ele mora há 36 anos no Brasil. Veio para cá com
a esposa, Susana, que conheceu na Inglaterra, onde fazia especialização em
direito.

Neta de
Celso Torquato Junqueira, que, em 1934, foi um dos cinco fundadores da ABCCRM,
ela assumiu, com a ajuda do marido, os negócios da família na Fazenda Tapiratuba,
em Morro Agudo (SP), propriedade que seleciona cavalos mangalarga há mais de um
século.

“Quem
cria cavalos, mesmo na crise, não para. Prova disso é que, mesmo nos últimos
anos, que foram complicados para diversos setores da economia, o mercado de
cavalos evoluiu e continua firme”, declara Serio. “Não dá para negar que as
vendas na nossa região foram afetadas, mas, devido aos eventos que tivemos e
outras ações, as perspectivas para os próximos anos são bastante positivas.”


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