Como diferenciar bullying de maldades e gozações ofensivas na escola

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 11 de dezembro de 2017 às 02:58
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:28
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É preciso distinguir entre bullying e agressões de menor potencial para garantir intervenção no momento certo

Qualquer gozação ou agressão sofrida por uma criança na escola pode ser considerada bullying? Para a assistente social e autora americana Signe Whitson, especializada em bullying e gerenciamento de conflitos entre crianças e adolescentes, é preciso aprender a diferenciar entre os comportamentos praticados dentro da escola justamente para não banalizá-los – e para saber como interferir em cada situação. Se tudo vira bullying, perde importância, comentou Whitson.

Segundo ela, a palavra bullying está sendo usada com tanta frequência que as pessoas pararam de prestar atenção. Os professores dizem, ‘estou cansado de ouvir isso’. O problema é que há crianças que estão sob risco real e os adultos não estão prestando atenção, porque estão cansados do assunto, diz.

O tema voltou ao debate no Brasil em outubro, quando um adolescente goiano disparou contra colegas dentro da escola, matando dois e ferindo outros quatro, incluindo uma jovem que ficou paraplégica. Ainda investiga-se se ele foi alvo de bullying antes dos atos.

Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE), cerca de 195 mil estudantes do 9º ano do ensino fundamental disseram, em 2015, terem sofrido bullying por parte dos colegas.

Se forem tratadas com a frase ‘criança é assim mesmo’, elas estarão muito vulneráveis a dores profundas. Sabe-se que o bullying tem sérias consequências de longo prazo. As vítimas têm tendência maior à depressão e ansiedade; os perpetradores têm tendência maior de vício em álcool ou drogas ou de comportamento criminoso, explica Whitson.

Ou seja, todos os envolvidos necessitam de ajuda adulta, e, quando o fato é minimizado, é o mesmo que negar essa ajuda.

Maldades e grosserias x bullying

A especialista diferencia, porém, o bullying do que chama de “grosserias” ou “maldades” entre os alunos – práticas que, embora devam ser enfrentadas, têm menor gravidade.

Nessa categoria ela inclui gozações ou desavenças que não cumpram com as três principais características que ela vê no bullying:

– O desequilíbrio de poder: é bullying quando um grupo “pega no pé de” ou exclui uma única criança, ou quando uma criança maior e mais forte alveja uma menor.

– A repetição: o bullying costuma ocorrer repetidamente, e não como uma ação isolada.

– A intencionalidade: o bullying é uma agressão proposital, feita com o objetivo de humilhar.

Esse espectro inclui agressões físicas e verbais, mas também relacionais – por exemplo, excluir ou isolar alguém socialmente, seja no ambiente escolar ou nas redes sociais. Todas essas ações costumam ter impactos profundos e duradouros tanto nas vítimas como nos praticantes.

Fazer essa distinção não significa minimizar comportamentos agressivos de menor potencial: a crítica de um aluno à aparência do outro, por exemplo, ainda que não tenha caráter repetitivo ou o objetivo de humilhar, pode ser ofensiva. O mesmo pode ser dito de uma agressão física.

Além disso, alguns comportamentos de menor gravidade podem, com o tempo, escalonar para o bullying caso não sejam interrompidos.

A diferença, é que é possível ensinar as próprias crianças a lidar com essas situações menos graves.

Bullying requer intervenção adulta

Casos de bullying, porém, extrapolam a capacidade das crianças e adolescentes de enfrentarem a situação por conta própria. Se há desequilíbrio de poder, intencionalidade e repetição nos atos com a intenção de humilhar, é preciso que adultos reconheçam a gravidade das agressões e intervenham – com cuidado para não agravar o problema.

No caso de professores, é crucial lidar com o assunto imediatamente, para interromper o comportamento agressor, mas sem sermões longos, que vão apenas envergonhar a vítima, deixá-la mais vulnerável e incentivar o agressor a repetir o comportamento mais tarde.

No longo prazo, é preciso interromper ciclos de violência dentro da escola – um problema para o qual não há soluções simples ou rápidas. E, nesse processo, é crucial não desistir das “crianças-problema”, diz a autora americana.

O papel dos pais

Segundo Whitson, ainda é comum que pais de vítimas de bullying ou de agressões cotidianas pratiquem dois tipos de comportamento que ela considera contraproducentes.

O primeiro é minimizar as agressões ou deixar as crianças lidarem com elas por conta própria; o segundo é exagerar na reação a qualquer briga dos filhos, já exigindo uma reparação por parte da escola ou da criança agressora e talvez expondo o próprio filho ainda mais. Segundo ela, nenhum desses comportamentos ajuda a vítima.

O papel dos pais é dar muito apoio e ser um bom ouvinte: escutar o filho, acreditar nele, abraçar, dar conforto e daí ajudar na resolução de problemas. Frases como ‘Ok, vamos pensar juntos: como vamos lidar com isso? O que você pode dizer ou fazer em determinada situação? O que você vai responder se seu colega disser tal coisa? Com quem você pode sentar para não se sentir vulnerável?’, devem ser ditas de maneira sincera para que a criança se sinta acolhida e também segura para pensar numa solução e forma de reação diante do problema.


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